As Roças de São Tomé e Príncipe, estudo
e investigação de Rodrigo Rebelo de Andrade e Duarte Pape, talvez seja neste
final de ano, a mais interessante novidade editorial nacional dentro da esfera
da arquitectura. O que mais surpreende nesta aposta da Tinta da China é a forma
como a investigação foi “manipulada”, se por um lado a editora não deixou de
transformar o estudo dos dois talentosos investigadores e arquitectos num valioso
instrumento de estudo para estudantes e arquitectos, por outro proporcionou ao
leitor um binóculo sobre o arquipélago para amantes de África e da história
colonial portuguesa. Perante esta publicação percebe-se que procura ocupar um
espaço que outras editoras especializadas, vão descurando e trabalhando com
pouca convicção e sentido. Em 2010 com “Moderno Tropical – Arquitectura em Angolae Moçambique, 1948-1975” de Ana Magalhães e Inês Gonçalves reconhecia-se um
atrevimento arriscado, confrontados com esta obra, somos a anuir determinação e escolha
acertada, iniciando um processo interno, de construção de uma “estante”
editorial que versa a arquitectura.
O trabalho apresentado por Rodrigo Rebelo de Andrade e Duarte Pape vem ao encontro de uma necessidade latente nas publicações
de investigação sobre arquitectura colonial, onde figuras como José Manuel Fernandes
em “Geração Africana”, de Livros Horizonte, “África - Arquitectura e Urbanismo de
Matriz Portuguesa” e “Arquitectura e Urbanismo na África” das edições Caleidoscópio;
Ana Vaz Milheiro em “Guiné-Bissau, 2011” da Circo de Ideias e “Os Trópicos sem
Le Corbusier” da Relógio D´Água; ou Miguel Santiago num registo mais
monográfico sobre “Pancho Guedes – Metamorfoses Espaciais” da Caleidoscópio, têm
vindo a promover, entre outros, a noção de que a arquitectura de raiz
portuguesa apesar de amplo e merecido estudo ainda é por nós, desconhecida. Esta
abordagem agora publicada assume uma rotura com o universo de publicações antes
produzido sobre a arquitectura luso-colonial africana, quase exclusivo ao
território Angolano e Moçambicano. Territórios como Cabo Verde, Guiné-Bissau e
São Tomé e Príncipe estão por descobrir apesar das incursões de Ana Vaz
Milheiro e Eduardo Costa Dias essencialmente sobre o séc. XX guineense e cabo-verdiano
e sobre o interessante e importante trabalho desenvolvido pelos gabinetes de
urbanização colonial entre 1944 e 1974.
Mais do que um inventário, tal como
assumem os autores no sexto capitulo, é fundamentalmente um enquadramento do
café no arquipélago e toda a orgânica tipológica e programática por detrás de
um contexto social gerado em torno desta cultura. As roças no seu edificado representam
uma época auspiciosa de um legado desenvolvido com diversidade formal e de escolha acertada dos materiais no desenvolvimento da construção. Para além dos 122
exemplos identificados, o enquadramento geográfico explanado permite uma
leitura num perfil historicista mais adequado às relações sociais e económicas ali
desenvolvidas. Perante um património pouco preservado e sem qualquer cuidado
governamental, mais à frente, os autores perspectivam o caminho a travar,
apostando fundamentalmente em processos de recuperação e preservação da riqueza
patrimonial encontrada.
Publicação de leitura fácil e de valor incomensurável
não só pela descoberta de tão “distante” e valioso património como pela
consubstanciação de um extraordinário legado fotográfico do jovem arquitecto e
fotografo Francisco Nogueira que permite ao leitor viajar sem comprar bilhete. Assumindo
a mesma perspectiva de José Manuel Fernandes no seu prefácio, esta obra
representa o estudo editado “mais aprofundado, inovador, esclarecido e
polifacetado” sobre o tema das roças em São Tomé e Príncipe. Para o leitor arquitecto
fica a faltar o registo técnico detalhado ou levantamento circunstancial ajustado
às suas expectativas, contudo a estrutura e beleza da obra que Tinta da China
nos presenteia, permite-nos a espera por mais um degrau na investigação, posteriormente com a coordenação
de José Manuel Fernandes neste belíssimo trabalho conjunto de três jovens
arquitectos da geração que agora emigra.
1.ª edição: Outubro de 2013
n.º de páginas: 240
isbn: 978‑989‑671‑175‑7
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